quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

[Crítica Social] Religião, privilégio, homossexualidade

RELIGIÃO, PRIVILÉGIO, HOMOSSEXUALIDADE

No último domingo, 03/02/2013, foi ao ar no SBT, no programa “De frente com Gabi”, uma longa entrevista com Silas Malafaia, pastor evangélico e pregador televisivo. O pretexto para a entrevista foi a recente reportagem da revista Forbes que estimou o patrimônio do entrevistado em 150 milhões de dólares – o assunto principal foi, no entanto, um outro bem diferente: homofobia.

Encaremos isto com franqueza: pouco importa, na verdade, o que Silas Malafaia pensa a respeito da homossexualidade. A sua opinião é apenas mais uma (ainda que, infelizmente, bastante comum). E uma bem conhecida, como a de quase todo padre, pastor, pregador, apóstolo (a que ponto chegamos!) ou outro qualquer homem que se esconde por detrás da bíblia: o seu único “fundamento” é uma certa crença, nada mais. Irracional, como toda crença. Algo que não se pode pretender universalizar, como toda crença. Algo que, portanto, não é e não pode ser um verdadeiro fundamento.

De todos os argumentos do pastor, parece digno de comentário apenas um (que, para o próprio pastor, não parece ser o mais importante): aquele segundo o qual a luta pelos direitos dos homossexuais seria uma luta por direitos especiais “em detrimento da coletividade”, isto é, por privilégios. É, sem dúvida, um argumento grave e preocupante, porque procura apresentar a luta dos homossexuais como uma luta contra todos mais e, ao mesmo tempo, propagandeia uma posição que permite (ou incentiva) a reprodução do preconceito como uma forma de resistência a favor da coletividade.

Ora, nada pode ser menos razoável. Este argumento pura e simplesmente inverte a situação real. Encarar a luta dos homossexuais como uma luta por privilégios implica desconsiderar a realidade brutal da discriminação e da exclusão, a realidade brutal da homofobia. Literalmente brutal, porque o preconceito é atroz, mas também porque este preconceito cotidianamente se converte em violência aberta.

Que fique claro: por razões muito específicas, não penso que o direito possa resolver essa questão. Mas não se pode supor que, nesta luta, os homossexuais exijam para si direitos a mais, em maiores proporções do que os direitos de que dispõe o “indivíduo médio”, instituindo uma desigualdade a seu favor. Exigem, na verdade, o mínimo que lhes é negado. Exigem a consideração, a dignidade, a sobrevivência que lhes são continuamente vetadas. Exigem precisamente o contrário do que diz o argumento dos “privilégios”: exigem a igualdade jurídica mais elementar e o fazem porque, como minoria, hoje, sem qualquer proteção jurídica específica, a sua situação de fato é desigual para menos em comparação com a maioria heterossexual.

Só mesmo as trevas do preconceito, do fanatismo ou do oportunismo podem cegar para uma realidade tão clara e, ao mesmo tempo, tão terrível.

[Publicações: O REGIONAL (Catanduva-SP), 06/02/2013.]